Por Thiago Tavares
Fotos: Ricardo Matsukawa/Mercury Concerts
O Alter Bridge, renomada banda de rock e heavy metal, decidiu desbravar novamente o cenário musical brasileiro, escolhendo o Espaço Unimed, em São Paulo, como o local para sua segunda passagem pelo país. Em uma noite de quarta-feira, 8 de novembro, a banda se viu diante do desafio de preencher um espaço que comporta até oito mil pessoas. Mesmo com a suspeita de que talvez o público não preenchesse completamente esse enorme espaço e considerando a singularidade de uma data no meio da semana, em meio a uma agenda intensa de shows na cidade, o Alter Bridge surpreendeu ao reunir um público expressivo e oferecer uma performance que certamente ficará gravada na memória dos fãs.
A jornada do Alter Bridge pelo Brasil, desta vez, foi restrita à capital paulista, onde sua primeira passagem pelo Brasil foi em 2017, incluiu participações em grandes festivais, como Rock in Rio e São Paulo Trip, com uma data solo em Curitiba. Agora, em 2023, a banda optou por concentrar suas energias em São Paulo, capital que sempre abraçou calorosamente o cenário musical internacional.
Desde o início, tornou-se evidente que o Alter Bridge não é uma banda que busca a grandiosidade nos espetáculos. A abertura precisa com “Silver Tongue” às 21h foi um testemunho disso. Mesmo com um som ligeiramente embolado, a execução parecia quase perfeita, levando alguns espectadores a pensar que se tratava de um playback, uma ilusão prontamente desfeita ao longo da noite. O Alter Bridge não precisa de truques ou efeitos especiais exagerados; a competência técnica da banda, liderada por Myles Kennedy (voz e guitarra), Mark Tremonti (guitarra e voz), Brian Marshall (baixo) e Scott Phillips (bateria), fala por si.
A sequência com “Addicted to Pain” manteve a energia acelerada, mas foi nos detalhes que os segredos começaram a se revelar. Mesmo em uma música pesada e frenética, Myles Kennedy percorria o palco com calma, como se estivesse poupando energia para o que estava por vir. E não é para menos. Além de assumir o protagonismo na guitarra em várias ocasiões, o vocalista de 53 anos mostrou, mais uma vez, sua habilidade vocal excepcional, sem perder uma única nota aguda. Se sua voz característica pode causar algumas discordâncias entre os ouvintes, não se pode negar a impecabilidade de sua técnica.
Após duas músicas intensas, Kennedy agradeceu ao público em português, dando início a uma interação mais longa antes de apresentar “Ghost of Days Gone By”. A atmosfera mais harmoniosa da canção acalmou os fãs, mas não os impediu de expressar sua devoção com coros fervorosos de “Alter Bridge! Alter Bridge!” que ecoaram por boa parte da plateia. Em um momento mais extenso de interação, Myles parecia genuinamente incrédulo e agradecido. “Uau, ‘what the f#ck’. Isso é incrível, vocês são incríveis”, expressou, antes de salientar que aquele momento fez valer toda a longa jornada, com horas passadas em aviões e carros.
Com um som menos embolado, “Sin After Sin” destacou ainda mais a posição ocupada por cada integrante na sonoridade única do Alter Bridge. A consistência oferecida por Mark Tremonti foi especialmente impressionante – um músico que joga para o time, evitando solos desnecessários para manter a base pesada. A balada mais convencional “Broken Wings” colocou a melodia em primeiro plano, inspirando mais um coro caloroso de “Alter Bridge! Alter Bridge!”. Neste ponto, a plateia estava completamente conquistada.
A apresentação permitiu um experimento interessante que vem sendo explorado pelo Alter Bridge: Tremonti assumiu os vocais da suave “Burn It Down”, enquanto Kennedy, curiosamente, se encarregava do solo. Embora a voz de Tremonti não tenha o mesmo diferencial que a de Kennedy, o momento trouxe uma nova dinâmica ao palco. “Cry of Achilles” marcou o retorno à intensidade, sendo um dos pontos altos da noite.
A partir deste momento, o repertório foi repleto de momentos belos, mas talvez um pouco previsíveis por terem sido apresentados em sequência. A interpretação de “Watch Over You”, conduzida apenas por Myles com violão, foi genuinamente comovente. Foi talvez a música mais cantada pelo público, a ponto de o frontman dividir um dos refrães com a plateia. “In Loving Memory” manteve a abordagem, mas com Mark no violão. “Blackbird”, com direito a trecho da música homônima dos Beatles na introdução, alternou peso com melodia e mais uma vez envolveu a plateia, mesmo que seja uma canção relativamente repetitiva.
O show ameaçou retomar a intensidade com a pesada “Come to Life”, fazendo muitos fãs pularem, mas a tentativa de tocar a pouco conhecida “Lover” pela 13ª vez na carreira, atendendo ao pedido de um fã, pode ter sido um tanto arriscada. Não tanto pela execução ligeiramente desalinhada – Myles brincou modestamente que “foi um sh#tshow, mas divertiu e era o que valia” – mas por se tratar de outra canção lenta em um momento crucial do setlist. “Pawns & Kings”, mesmo com seu pedal duplo em destaque, manteve parte da plateia um tanto dispersa, recuperando reações mais efusivas apenas nos gritos finais de Kennedy.
Felizmente, o ápice estava reservado para o final do show. Quatro das músicas mais reconhecíveis do Alter Bridge foram apresentadas em sequência. Começando com a pesada e viciante “Isolation”, seguida por “Metalingus”, onde a cozinha de Scott Phillips e Brian Marshall desempenhou um papel crucial. Famosa por ser a música tema do lutador Edge na WWE, “Metalingus” proporcionou um raro momento de interação com o público, com uma competição de “qual lado grita mais”. Após uma breve pausa para o bis, o quarteto retornou ao palco com uma bandeira do Brasil em mãos, fazendo todos cantarem a quase radiofônica “Open Your Eyes” – incluindo os coros de Myles – e se despediu com a mensagem inspiradora de “Rise Today”, que versa sobre como o amor pode mudar o mundo.
Não se pode negar que o show do Alter Bridge ressoa de maneira mais profunda para aqueles que já estão “convertidos” ao som da banda. A escassez de interações e as execuções fiéis às gravações de estúdio podem tirar um pouco do tempero que geralmente dá sabor extra a uma apresentação ao vivo, especialmente para aqueles que apreciam a banda sem necessariamente cultuá-la.
Em conclusão, o show do Alter Bridge, apesar de sua abordagem mais técnica, foi mais do que uma simples apresentação; foi um tributo à maestria musical, à dedicação dos fãs e à conexão duradoura entre a banda e seus admiradores na América do Sul. O quarteto entregou uma performance que transcendeu as expectativas, reafirmando sua posição como uma das principais forças do rock e heavy metal contemporâneos. Que venham mais shows, mais músicas e mais momentos memoráveis para o Alter Bridge e seus devotos seguidores.
Em nome do Ponto Zero, agradecemos a Simone e a Denise Catto da Catto Comunicação pelo credenciamento para a cobertura do show.
SETLIST ALTER BRIDGE NO ESPAÇO UNIMED – 08 DE NOVEMBRO DE 2023
Silver Tongue
Addicted to Pain
Ghost of Days Gone By
Sin After Sin
Broken Wings
Burn It Down (Mark Tremonti nos vocais)
Cry of Achilles
Watch Over You (acústica, apenas com Myles Kennedy)
In Loving Memory (acústica, com Myles Kennedy e Mark Tremonti)
Blackbird
Come to Life
Lover
Pawns & Kings
Isolation
Metalingus
Bis:
Open Your Eyes
Rise Today
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